domingo, 10 de maio de 2015

Fontes de S.Migueel D'Acha

As letras garrafais da primeira página dos jornais do dia, quais néons pendurados nos prédios da cidade, despertaram-me a atenção. Ao começar a debulhar, de forma descuidada, as letras mais pequenas, deparei com a expressão: segundo fonte oficial... Lembrei-me das expressões recorrentes, principalmente em notícias sobre política. Fonte bem colocada, segundo fontes geralmente bem informadas, várias fontes…
O significado do dicionário sobre fonte: manancial de água que brota do solo; nascente, indica-nos algo que aparece sem nos darmos conta, que nasce e nos convida a descansar e a refrescar. Um dom da natureza!
E sem me dar conta, ou talvez não, veio-me à memória as fontes da nossa terra. Havia-as em abundância. Todas elas faziam falta. Por muitos caminhos se movia a povoação. Era necessário haver locais que “ matassem” a sede. Dessem um pouco de frescura no verão. Obrigassem a um pequeno descanso, quando o cocho, as mãos ou outro vasilhame recolhia a água da fonte. 
Fontes que recolhiam segredos. Davam nome ao local circundante. Ganhavam nome pelo hábito da população ou até pelo facto de não servirem para aquilo que se destinava, tal como a Fonte Seca. Mas também a novidade que surgia com a Fonte Nova no Cabeço da Azeda. Também não faltou a fonte institucional - Fonte do Concelho. Talvez por lá se discutisse um pouco de política ou seria uma homenagem à sede de concelho? Também já algumas acabaram como a Fonte das Pias. Houve as já nasceram com diminutivo como a Fonte da Fontainha ou na rocha como a da Fraguinha. Também temos a fonte com nome esquisito, talvez proveniente de se lá fazerem necessidades, no sítio dos Barros.
Com melhores acessos como a Fonte da Calçadinha. A das águas minerais – Fonte dos Sinos, que apresenta propriedades terapêuticas, sendo tão pouco explorada essa capacidade. Lembrança do mar – Fonte do Salgado?
Das que não temos acesso por terem sido apropriadas, temos a Fonte da Vinha Grande e a Fonte dos Namorados. Esta última, por certo, guardará muitos segredos. Ali se cruzaram olhares que deram em namoro. Sussurros de namorados marcando encontros. Beijos roubados à pressa. Talvez muitos de nós “nascessem” por ali.
E são estas águas prateadas pelo luar, que na sua quietude guardam as lembranças dos que por lá passaram, que também se erguem como fontes da nossa memória. Que bem o canto alentejano as descreve: “Não m'invejo de quem tem. Parelhas, éguas e montes; Só m'invejo de quem bebe. A água em todas as fontes.”
Deixo um desafio ao António Milheiro para a ADEPAC organizar um passeio, no verão, pelas fontes e que este tenha uma boa adesão, pois a preservação da nossa cultura exige que todos nos movimentemos pelo conhecimento das nossas tradições. Talvez no passado encontremos ou compreendamos o futuro dos nossos filhos, tal como os nossos pais o fizeram. Guardemos as suas memórias e saibamos também homenageá-los.


Manuel Ruivo

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